Arapiraca, uma cidade que se formou em torno de uma feira

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A frase do músico Hermeto Pascoal, filho de Lagoa da Canoa, considerado um dos melhores do mundo e que viveu na infância e adolescência todas as segundas em Arapiraca, bem mostra a importância da feira-livre para o crescimento do município. Dizia ele: “Não se trata de uma feira que se estabeleceu numa cidade. Mas uma cidade que se formou em torno de uma feira.”

Hermeto Pascoal nasceu em 1936 e, segundo ele, desde os seis anos de idade ia com seus parentes à feira de Arapiraca. Primeiro, comer bolo e chupar pirulito vendidos nas bancas; depois, “ouvir” os sons, como o “ruídos das marteladas e o trote das mulas, …ou “o burburinho de vozes acordando mais cedo os moradores das ruas do centro.

Mas, nem sempre foi assim. Tudo começou em 1884, quando o jovem Esperidião Rodrigues, vendo o desenvolvimento do povoado Veados (hoje Canaã) com sua feira livre, ondes os moradores da região compravam alimentos (farinha de mandioca, carne fresca e seca – hoje conhecida como carne do sol), vendiam produtos (principalmente algodão), trocavam entre si outros produtos originários do trabalho na roça, lançou a ideia de uma feira na localidade de Arapiraca. Chamou os homens do local, quase todos familiares, e convenceu a todos. Ele, aliás, foi um dos beneficiados, pois era junto com seu primo Florêncio Apolinário proprietário de um armazém que vendia de tudo, inclusive tecido (bem disse o historiador Zezito Guedes). Surgiu, então, muito incipiente, a feira de Arapiraca.

Já em 1920, quatro anos antes da emancipação política, a Feira de Arapiraca ultrapassava a feira de Limoeiro, município do qual fazia parte.

A feira de Arapiraca se expandiu.

Às segundas-feiras, mais e mais ruas eram incorporadas ao comércio livre: primeiro, a Rua do Quadro (hoje Praça Manuel André), e depois vieram a Rua Boca da Caixa (15 de Novembro), Rua Pinga Fogo (Aníbal Lima), parte da Praça Bom Conselho (por trás da Igreja Nossa Senhora do Bom Conselho, parte da hoje Rua Fernandes Lima (da Rua do Quadro até a residência de Valdomiro Barbosa), parte da Rua do Cedro (Avenida Rio Branco), hoje a Rua Esperidião Rodrigues, a Rua do Peixe (hoje Rua professor Domingos Rodrigues).

E tinha de tudo.

Batata-doce do Mocambo (vindo de Feira Grande), tecido e produto de couro vindos de Palmeira dos Índios, fumo em corda de diversas áreas do município, legumes e frutas de Cana Brava (Taquarana) e Limoeiro. Utensílios para o lar, frutas, verduras chegavam toda segunda-feira em Arapiraca. E, repetindo (sem cansar) o músico Hermeto Pascoal: “Se hoje eu faço música universal é porque na feira de Arapiraca já se fazia música universal”.

Homem de chapéu segurando microfone

Descrição gerada automaticamente

Hermeto Pascoal cantou o som da feira de Arapiraca. Ele é universal, disse.

Ah, a feira-livre de Arapiraca!

Feira dos nossos tempos de menino, dos carroceiros (de burro) e dos carroceiros (de mão); dos carregadores e montadores de toldas; dos empregados das lojas e mercearias. Feira da venda, da troca, do bêbado caído nas calçadas; feira do ambulante, da dona de casa, dos alagoanos vizinhos de Arapiraca (aqui vinham vender seus produtos); feira do vendedor de picolés (os de maçãs eram melhores). Feira do poeta e do cidadão honorário arapiraquense (título concedido pela Câmara de Vereadores, projeto de Maurício Fernandes, ao Hermeto Pascoal):

“Não se trata de uma feira que se estabeleceu numa cidade. Mas uma cidade que se formou em torno de uma feira. Desde que Arapiraca é Arapiraca, todas as segundas-feiras, certo como é o nascer do sol, era também os ruídos de marteladas e o trote de mulas com suas cargas rangentes, o burburinho de vozes acordando mais cedo os moradores das ruas do centro.

“Dezenas, centenas de rostos anônimos, desconhecidos e ao mesmo tempo familiares. Gente de Arapiraca, de Palmeira (dos Índios), de Lagoa da Canoa, de Limoeiro de Anadia, gente da cidade e gente do sítio, gente de perto e gente de longe, gente que cresceu frequentando a feira e gente que eu vi um pouco mais velha a cada segunda-feira.

“O cheiro-verde do coentro fresquinho e ainda molhado de orvalho, o cheiro forte do fumo, o cheiro azedo da massa puba, todos os cheiros e fedores da feira, o desarrumar das cargas para arrumar as bancas, um caos buscando organizar-se. Era como música”.

Ou do João do Pife (que fixou residência no bairro de Canafístula), do Zé do Rojão (filho de Coité do Noia, mas apaixonado por Arapiraca); do Aloísio de Folha Miúda (que cantava Arapiraca e sua feira nas rádios Globo e Tupi, do Rio de Janeiro). Ou, já agora, do Afrísio Acácio, com sua poesia na antiga Praça da Prefeitura.

Esta feira, cantada por muitos e tão bem historiada por Zezito Guedes (em seu livro Arapiraca Através do Tempo), já não existe mais. Foi desmontada e deslocada para ruas da periferia, principalmente para os lados do bairro Baixão.

Certo ou errado, ficou só a memória.

Feiras livre em Arapiraca hoje

Sem as lembranças de um passado não muito distante, a cidade de Arapiraca tem feira livre todos os dias, afora a tradicional às segundas-feiras, e que engloba as seguintes ruas: Maurício Pereira, Teodorico Costa, do Sol, Pedro Leão, Tiradentes, Miguel Correia Amorim, Padre Cícero, José Lopes da Silva e Manoel Ângelo Tavares.

Nos outros dias: feira da Primavera (aos domingos), nas ruas Engenheiro Camilo Colier, 31 de Março, Sargento Benevides, Olinda e Braz Vieira; feira do Baixâo (também aos domingos) na rua Miguel Correia do Amorim; feira da Brasília (às quintas-feiras), nas ruas Senador Rui Palmeira, Firmino Leite e Domingos Barbosa; do bairro Itapoã (aos sábados), nas ruas Nossa Senhora da Salete e Nossa Senhora do Ó; feira no bairro Senador Teotônio Vilela (aos domingos), nas ruas São Paulo, Nossa Senhora das Dores, Samaritana e São Geraldo; feira no Jardim Esperança (aos domingos) na Praça Maria das Dores; feira no Jardim Tropical (aos domingos), na Rua Adão Henrique; feira na Canafístula (aos domingos), na rua Lúcio Vital; feira fixa da Fumageira (de domingo a domingo), na Praça Eloísio Lopes.

Feiras livres não faltam em Arapiraca. Por todos os lados, o arapiraquense ou o visitante encontram de tudo. O município, descentralizando a feira livre, ofereceu ao seu munícipe a comodidade e a facilidade. Retirou o bucolismo da maior feira livre do nordeste, cantada em prosa e verso em todos os cantos do Brasil. 

A alegria do arapiraquense, no vai e vem na feira livre, ficou só na saudade.

Donas de casa, carroceiros, vendedores, uma mistura que ficou na lembrança do arapiraquense.

Fonte: Jornal de Arapiraca/ Manoel Lira, Eli Mário e Roberto Baía

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