O novo artigo do deputado federal Daniel Barbosa, intitulado “Zumbi, Liberdade e Desigualdade Racial” traz reflexões profundas sobre o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, ressaltando a importância histórica e simbólica do quilombola na luta contra a escravidão e pela liberdade dos afrodescendentes.
O texto destaca a persistência das desigualdades raciais no Brasil, apesar dos avanços legislativos e das ações afirmativas, como as cotas nas universidades, delineando a urgência de medidas mais eficazes para a inclusão social dos negros. O deputado salienta a necessidade de tributos menos onerosos para os mais pobres, reforma agrária, atenção às regiões metropolitanas e apoio às iniciativas que promovam a qualidade de vida dos afrodescendentes.
“É preciso ir além, porque para realmente melhorar a qualidade de vida da população negra e reduzir a desigualdade racial é indispensável estimular, aperfeiçoar e efetivar os programas de integração social. (…) Estou engajado nessa luta, somando meus esforços contra a fome, a pobreza extrema e por mais medidas de inclusão social. É este o caminho do bem, da solidariedade e da fraternidade”, destacou o parlamentar.
Confira o artigo na íntegra:
ZUMBI, LIBERDADE E DESIGUALDADE RACIAL
Celebra-se em 20 de novembro o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, instituído pela Lei nº 12.519/2011. Em 20 de novembro de 1695, morria Zumbi, o destemido líder negro do Quilombo dos Palmares, na Serra da Barriga, região hoje pertencente ao município de União dos Palmares, situado no estado de Alagoas, personagem maior da luta contra a escravidão e pela liberdade de culto, religião e prática da cultura africana.
O nome e o exemplo de Zumbi dos Palmares são reivindicados pelos movimentos negros como símbolos da resistência e das conquistas no campo dos direitos civis. A saga de Zumbi é sugerida nas Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnico-Raciais. Por sua vez, a Lei nº 10.639/2003 introduziu no calendário escolar a data de 20 de novembro como Dia Nacional da Consciência Negra e determinou a obrigatoriedade do Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana nas escolas brasileiras, a fim de difundir e valorizar as matrizes africanas na formação da nossa sociedade.
A data remete a questões importantes e estimula a necessária reflexão sobre a desigualdade social, o racismo estrutural e as injustiças e as crueldades praticadas ao longo de séculos contra a população negra, que ainda sofre com a falta de oportunidades. A humanidade tem uma dívida imensa com os negros e, numa iniciativa de combate ao preconceito e às desigualdades sociais, a Assembleia Geral da ONU proclamou a Década Internacional dos Afrodescendentes (2014-2024).
Nosso país recebeu aproximadamente 40% dos africanos retirados à força de suas terras e enviados para as Américas como escravos. Também foi o último país a abolir a escravidão, sem o amparo de políticas públicas que garantissem a inclusão do negro em um novo cenário social. A perversa ideologia do branqueamento prevaleceu no debate sobre a questão racial e os afrodescendentes foram tratados como seres inferiores e submetidos às tarefas mais subalternas.
Abdias do Nascimento, deputado federal e senador que durante toda sua vida combateu o racismo, considerou a abolição da escravatura uma mentira cívica. Nelson Mandela ficou 38 anos na prisão por lutar contra o “apartheid” e tinha inteira razão ao advertir que “não existe caminho fácil para a liberdade”.
A discriminação entre os seres humanos é uma grave doença social a ser combatida em todos os quadrantes do planeta e a segregação racial é uma maldade continuada que se faz aos negros. Por isso, não é exagero afirmar que a dívida com a raça negra é a maior dívida da História do Brasil, impossível de ser paga com discursos políticos. Paga-se com gestos de reconhecimento e de oportunidades de ascensão social, educação e participação no processo decisório da nação.
Passados 135 anos da abolição da escravatura, o negro no Brasil ainda enfrenta as piores condições de educação, saúde, renda, habitação, mercado de trabalho, violência e expectativa de vida. É a população negra que morre mais cedo. São os negros que representam 77% dos extremamente pobres, são os negros que somam mais de 70% dos mortos em decorrência de intervenções policiais e são os negros que correspondem a 67% da massa carcerária.
No mercado de trabalho é injusta a realidade imposta à população negra. Entre os desempregados são majoritários e, quando empregados, sofrem dificuldades de ascensão profissional e têm remuneração bem menor do que aquela auferida pela população não-negra, para funções idênticas. Também é inaceitável a concentração de negros nas faixas da população de menor escolaridade. Nas universidades ainda é irrisório o número de afrodescendentes.
A pobreza faz do negro o alvo prioritário da violência no país. Nas regiões onde a carência econômica, educacional e material se espalha, a criminalidade encontra o ambiente ideal para se instalar. Esse fenômeno, entre outras aflições, provoca o aumento vertiginoso dos homicídios nas comunidades negras.
A atuação firme dos movimentos de defesa dos afrodescendentes intensificou o debate público, fortalecendo as políticas governamentais para combater o racismo e a segregação. Promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação é objetivo fundamental da república. O crime de racismo é inafiançável e imprescritível, por força de norma constitucional com status de cláusula pétrea, mas vemos aberrações acontecendo frequentemente.
Em 2003, foi criada a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, com status de ministério e vinculada à Presidência da República, dando mais densidade ao enfrentamento da problemática racial. Em janeiro de 2023, foi criado o Ministério da Igualdade Racial.
Em 2010, veio o Estatuto da Igualdade Racial. A lei foi sancionada sem vetos, prevendo, entre outros pontos relevantes, o incentivo de atividades produtivas rurais para a população negra ao tempo em que proibiu a exigência de aspectos particulares de etnia para postos de trabalho. Além disso, garantiu às comunidades quilombolas o direito à preservação dos seus costumes e o acesso a linhas especiais de financiamento público.
Estou convicto da eficácia das ações afirmativas como instrumentos de criação de oportunidades para grupos sociais historicamente excluídos. Creio no sistema de cotas como mecanismo de inclusão social e, desde a sua edição, a Lei de Cotas fez justiça, transformando o contexto de acesso ao ensino superior brasileiro.
No dia 14 deste mês de novembro, o presidente Lula sancionou o Projeto de Lei nº 5.384, de 2020, atualizando a Lei de Cotas. Participei da Sessão Deliberativa da Câmara dos Deputados, de 9 de agosto deste ano, que aprovou essa importante proposição legislativa, votando a favor do regime de tramitação de urgência e do substitutivo que resultou na Lei nº 14.723/2023, versando sobre o “programa especial para o acesso às instituições federais de educação superior e de ensino técnico de nível médio de estudantes pretos, pardos, indígenas e quilombolas e de pessoas com deficiência, bem como daqueles que tenham cursado integralmente o ensino médio ou fundamental em escola pública”.
O novo texto, entre outros aspectos, alterou os critérios de ingresso de cotistas no ensino superior, ajustando a exigência de renda para reserva de vagas e incluiu estudantes quilombolas como beneficiários. Houve redução, para um salário-mínimo, do valor do teto da renda familiar para admissão no curso superior por meio do perfil socioeconômico. Foi conferida prioridade aos cotistas para recebimento do auxílio estudantil e estendidas as políticas afirmativas para a pós-graduação.
Avançamos, é verdade. Porém, a meu ver, de forma tímida. É preciso ir além, porque para realmente melhorar a qualidade de vida da população negra e reduzir a desigualdade racial é indispensável estimular, aperfeiçoar e efetivar os programas de integração social.
Certamente, os nefastos efeitos da escravidão e do racismo estrutural reclamam tributos menos gravosos para os mais pobres e uma reforma agrária que prestigie a agricultura familiar. As regiões metropolitanas precisam de mais atenção do poder público para uma vida digna acessível a todos, sem violência urbana, com oferta de moradia e oportunidades de educação, trabalho e renda para a juventude.
As atividades de desenvolvimento e inclusão social que resultem em melhor qualidade de vida para os afrodescendentes devem merecer o apoio de todos. Esse conjunto de ações é indispensável ao combate de toda e qualquer desigualdade e suas piores sequelas, que são a discriminação, o preconceito e o racismo. Estou engajado nessa luta, somando meus esforços contra a fome, a pobreza extrema e por mais medidas de inclusão social. É este o caminho do bem, da solidariedade e da fraternidade.
Por Assessoria