lexais, no bairro de Bebedouro, estão insatisfeitos com o Ministério Público Federal (MPF), com os órgãos ambientais e com a Prefeitura de Maceió. Eles alegam que o acordo feito em 2022, por essas entidades públicas, prejudicou as famílias que não aceitaram deixar suas casas e pontos comerciais.
“Quem aceitou esse acordo se arrependeu”, afirmou o comerciante Valdemir Alves dos Santos, de 51 anos, que morra no Flexal de Cima. Segundo ele, muitas famílias que receberam R$ 25 mil de indenização da Braskem gataram o dinheiro pagando dívidas ou comprando comida e hoje não têm onde morar.
“A maioria voltou para o aluguel ou se mudou para casas de parentes, além daquelas que retornaram para o interior do Estado ou estão morando em barracos a beira da lagoa”, relata Valdemir, que se recusou a receber os R$ 25 mil de indenização, oferecidos pela Braskem.
Para ele, o dinheiro oferecido pela mineradora ficou bem mais baixo do valor da sua casa. “Além disso, só aceitamos sair daqui se o poder público garantir um local seguro para a gente morar”, afirmou. “Não adianta a Braskem querer tirar a gente daqui, com o aval do Ministério Público e da Prefeitura, se a empresa e as autoridades não apresentam uma alternativa de moradia para os moradores dos Flexais”, acrescentou.
Valdemir disse ainda que os demais moradores, aqueles que ficaram, estão unidos em torno de uma proposta da Defensoria Pública do Estado de Alagoas pela reconsideração do acordo, já que a indenização paga pela Braskem, além de irrisória, não resolveu o problema habitacional dos Flexais.
Queda de barreiras
“Se antes a gente sofria com as fortes chuvas, que ameaçaram derrubar a barreira e soterrar as nossas casas; hoje, sofremos também com o afundamento do solo, que já provocou rachaduras em diversas moradias”, relatou Sassá, como é conhecido Antônio Domingos dos Santos, de 52 anos.
De acordo com ele, cerca de 812 moradias ainda resistem nos Flexais de Cima e de Baixo, sem que a Braskem tenha pagado para desativá-las. “São mais de 3500 famílias vivendo em situação de risco, em total isolamento, sem os serviços públicos essenciais à sobrevivência humana”, afirmou.
Sassá e Valdemir receberam a reportagem da Tribuna Independente na tarde da última segunda-feira (24/7), quando denunciaram a situação de abandono e isolamento dos moradores dos Flexais. Percorreram com nossa equipe as principais ruas do Flexal de Cima e de Baixo, até a estação de trem, já na divisa com Bebedouro.
“Quem mora no Flexal de Cima, Fernão Velho, Rio Largo e Satuba, que antes tinha na linha do VLT uma opção de transporte coletivo, agora tem que fazer a baldeação nos ônibus, parados na estação, para completar a viagem e chegar ao destino pretendido”, relatou Valdemir. Segundo ele, o trecho seguinte do VLT, que seguia até Lourenço de Albuquerque, encontra-se interditado desde as últimas enchentes.
Ação Civil Pública pede reparação integral de cerca de 9 mil moradores
Na mesma rua da estação do Flexal de Baixo, onde a composição do VLT chega de Maceió e retorna para o Centro da cidade, um imóvel se destaca em meio aos demais em escombros. É a casa da psiquiatra alagoana Nise da Silveira, uma referência internacional nos estudos da psiquiatria e da psicanálise. Nela, Nise morou com o pai, o professor Faustino Magalhães da Silveira, que dá nome a uma escola pública e a uma importante artéria do bairro.
Cercada de tapumes de alumínio, a casa onde Nise e seus pais moraram (a mãe dela chamava-se Maria Lydia), foi toda reformada, recentemente, com a ajuda do Instituto Patrimônio Histórico e Arquitetônico Nacional (Iphan), mas se encontra fechada à visitação pública.
Mais à frente, a sede da Colônia de Pescadores dos Flexais, que em 2025 completa 100 anos de fundação, estava aberta e sem tapumes, porque o trecho não foi considerado de risco e ficou de fora do Plano de Ações Sociourbanisticas (PAS), firmado pela Braskem, com o aval da Força Tarefa e da Prefeitura de Maceió.
Na terça-feira (25/7), o MPF divulgou uma nota, dizendo que havia se reunido com os demais integrantes da Força Tarefa e da empresa Diagonal Empreendimentos para avaliar o plano, além de discutir ações urgentes e consensuais.
Sem acordo com MPF
Além dos moradores, o acordo celebrado pela Braskem – com o aval do MPF, do MPE, da Defensoria Pública da União (DPU) e da Prefeitura de Maceió – é rejeitado pelas lideranças que atuam em defesa das vítimas do afundamento do solo em outros bairros de Maceió.
Para a bióloga Neirevane Nunes, coordenadora do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB), “mais um acordo injusto, sem a anuência da população afetada, sem que esta tenha participado da construção dos termos desse acordo e ainda com a rejeição da proposta por parte da maioria dos afetados”.
Segundo ela, foi com base na insatisfação dos moradores dos Flexais que a Defensoria Pública do Estado de Alagoas impetrou uma ação na Justiça Federal solicitando a reavaliação do acordo.
“Atendendo aos apelos dos moradores dos Flexais, Quebradas e Marquês de Abrantes, que se encontram isoladas e em situação de total vulnerabilidade resultante do crime da Braskem, que os defensores públicos buscam o apoio da Justiça para reavaliação desse acordo, que tem se mostrado extremamente nocivo à comunidade local”, explicou.
Neirevane informou ainda que Ação Civil Pública na Justiça Federal se encontra em tramitação e representa a defesa do direito de reparação integral de cerca de 9.450 moradores. Esta ação tem como principal objetivo anular o acordo firmado em outubro do ano passado entre a Braskem e Força Tarefa (MPF, MPE e DPU).
Por mais que os órgãos de fiscalização e controle queiram defender o acordo, para a ativista da causa, “a vontade da população foi desrespeitada”. Em artigo publicado no mês de fevereiro último, Neirevane deixa isso muito claro. Apesar de reconhecer que a população participou de várias escutas públicas, inclusive promovidas pela Prefeitura de Maceió, mas a maioria sempre se mostrou insatisfeita.
“Na própria audiência no MPF, ocorrida em agosto de 2022, novamente a maioria dos afetados reafirmou a sua escolha pela realocação com indenizações justas, mas mesmo assim, contra a vontade do povo, o acordo foi celebrado”, destacou, acrescentando que o acordo tem se mostrado lesivo “porque leva a população a abrir mão de uma série de direitos”.
Por Ricardo Rodrigues – colaborador com Tribuna Independente