A ESPERANÇA EQUILIBRISTA

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Apresentada pela canção ‘O bêbado e a equilibrista’ de Aldir Blanc e João Bosco, a esperança equilibrista surge com força poderosa no último levantamento da IPSOS. A pesquisa realizada alcançou 70% da população global e, apesar de registrar as várias crises que estamos vivendo, traz um dado interessante para um contexto de policrise: “embora a maioria seja pessimista em relação ao ambiente macro, continuam sendo muito positivas acerca das suas perspectivas pessoais e familiares”.

E por que isso me causou espanto? Porque esse levantamento e estudos feitos nas grandes universidades apresentam um quadro que, na visão de Adam Tooze, da Universidade de Columbia, se assemelha a “uma caminhada sem fim na corda bamba”. Somado a isso, entendo como Tooze que o uso pelos estudiosos do nome genérico policrise indica que não somos capazes, hoje, de compreender, sequer conceitualmente, a situação atual. 

Sabemos que enfrentamos uma emergência climática somada a uma financeira e a uma energética e, como fomos incapazes de diminuir as desigualdades, vivenciamos também crises geopolíticas no mundo inteiro, que trazem um nível de complexidade à realidade atual difícil de ser medido. E, aqui, novamente sou levada a concordar com Tooze quando tentando conceituar termo genérico diz que “uma policrise não é apenas uma situação em que você enfrenta múltiplas crises. É uma situação na qual o todo é ainda mais perigoso do que a soma das partes”.

Pensando nisso e olhando para a dança da esperança na corda bamba, temo que ela seja resultado dessa incompreensão geral. E embora esse não seja um dado novo – a maioria de nós não consegue ler corretamente a realidade – no presente, não saberíamos onde encontrar pessoas capazes de atuação significativa, no enfrentamento das crises, quando ela se fizer necessária. Assim, tal qual a lua, na canção de Blanc e Bosco, estamos carentes de luzes, mas diferentes dela não temos onde busca-la.

A investigação, publicada no último dia nove, conclui que as crises terão vida longa e que a ordem mundial implantada desde a Segunda Guerra, que trouxe estabilidade a grande parte da população global, está se fragmentando. Um dos sinais dessa fragmentação é a descrença nas instituições – 72% estão preocupados que os governos e os serviços públicos não cuidem dos cidadãos, no futuro e, 54% não acreditam que líderes empresariais digam a verdade – esta falta de confiança se constitui numa barreira para Estados e empresas liderarem o enfrentamento a estas crises.

Mas para não dizer que não falei das flores como Geraldo Vandré, no Brasil, o novo governo goza da confiança da maioria da população – 55% considera que o país está no rumo certo. O índice é superior à média global, que é de 38%.

Essa confiança também se vê traduzida na preocupação com a inflação – apenas 27% dos brasileiros se dizem incomodados com a alta de preços, um número inferior à média global que é de 43%. Há, portanto, convicção de que o presidente brasileiro está comprometido com o combate à subida continuada do nível geral dos preços. 

A maior preocupação dos brasileiros é antiga e já estava presente nos versos de Vandré, de 1968, ‘pelos campos, há fome em grandes plantações, pelas ruas, marchando indecisos cordões”. 43% dos entrevistados disseram que a pobreza e a desigualdade lhes afligem, 12% acima da média global. 

Isso, entretanto,  não nos impede de continuar “ caminhando e cantando e seguindo a canção” o que nos faz o quinto país mais feliz, entre os 32 analisados. 83% dos brasileiros, que responderam às perguntas, consideram-se muito felizes ou felizes. Uma alta de 20% em relação ao último levantamento, feito em dezembro de 2021.

Encerro o texto, torcendo para que a esperança que se equilibra na corda bamba dos nossos tempos resulte mais dessa tal felicidade e menos do desconhecimento da realidade.  

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